segunda-feira, 28 de junho de 2010

Enquanto isso, no Canadá...

Um grande império tem prazo de validade. Assim como, naturalmente, as características das sociedades que os formam. “O Declínio do Império Americano” (1986), do diretor franco-canadense Denys Arcand, procura estabelecer um paralelo entre o cotidiano de oito integrantes da classe média intelectual canadense e o exacerbamento das individualidades que cercam, sob a análise da obra, os motivos pelos quais o Império Americano chegou ao fim. O filme conta a história de quatro professores universitários que se reúnem durante um fim de semana em uma casa de campo. Enquanto cozinham e conversam sobre sexo, amor, história e sociedade, aguardam suas esposas e amigas para o jantar. As mulheres, ao mesmo tempo, passam o dia em uma academia de ginástica de Montreal discutindo os mesmos temas.






Ao fim do dia, todos se encontram e a discussão permanece viva, dando início a uma série de conflitos entre os personagens. O filme aborda um panorama diferenciado da análise do fim do sonho comunista, traduzida nos anseios de intelectuais que percebem nas suas próprias vidas os reflexos da mudança de paradigma no mundo a três anos da queda do Muro de Berlim. O individualismo se fez presente, os Estados Unidos veem o fim do “american dream” e os canadenses, à beira de um lago, tomam vinho e falam sobre suas aventuras sexuais, traições, amores e desilusões. Fica óbvio, antes de tudo, o esforço do diretor em humanizar a questão política – pano de fundo do filme – em vez de apelar para os clichês que costumam habitar obras sobre o mesmo tema.


“O Declínio (...)” também trunfa por aliar uma força narrativa despretensiosa a uma técnica cinematográfica invejável, utilizando recursos de sensibilidade ímpar. Exemplo disso é o controle do foco das lentes do filme. O foco inquieto procura trazer cada personagem e suas respectivas histórias para o centro da atenção do espectador. Além disso destacam-se também a belíssima fotografia em tons de azul e uma trilha sonora intimista. Em 1986, onde não se enxergava um palmo de futuro à frente, dada a conjuntura social e política do mundo, Denys Arcand nos proporcionou um tratado quase premonitório da sociedade que, vista aos olhos de hoje, 24 anos depois, nos parece muito com aquela conversa de fim de tarde à beira de um lago nos arredores de Montreal.
Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...