
A França sempre – ou quase – nos brinda com
grandes filmes e reflexões. Hoje então vamos falar de existencialismo, dialogaremos
com a morte e o não deixar nada para trás. Ser capaz de seguir um caminho sem
volta e não olhar para o que se abandonou. Esquecer amor em ordem de não se
machucar. O Tempo Que Resta (Le Temps Qui Reste, 2005) é a nossa
película da vez.
Romain (Melvil Poupaud) é fotógrafo de moda e aos
31 anos é diagnosticado com câncer terminal. Muitos filmes fariam uma história
sobre Como Aproveitar Da Melhor e Mais Divertida Maneira Seus Últimos Dias, mas
não este. Romain abandona tudo e todos para aceitar sua morte sozinho. Ele
recorda do mar e do seu tempo quando criança, vive dentro de suas lembranças
enquanto ignora seu namorado, sua irmã grávida e seus pais. Como uma onda
grande, ele os afasta de sua praia decrépita violentamente. E vaga sozinho a engolir o
sol.
O que fazer com o tempo que nos resta? O
protagonista tem essa pergunta martelando em sua cabeça desde o anúncio de sua
doença e só encontra – talvez – significados e respostas com sua avó, uma
mulher que abandonou a família para viver a vida como gostaria. Os dois são
frutos de uma mesma árvore, caídos em gerações diferentes, e com o mesmo
gosto. Ele e ela se entendem, mas ainda assim Romain decide seguir seus últimos
dias sozinho.
E por que um fotógrafo? Por que alguém deseja
eternizar momentos se já sabe que está no fim da vida? Ele não para, sempre com
sua câmera digital consigo. Por que fotografar outras coisas se não a si se queres estar sozinho? Ele escreve com as fotografias um réquiem para sua própria lápide. Uma sinfonia mortal em uma espécie de “road movie existencialista”. A tragédia de um único ser humano
egoísta nunca foi tão encantadora, e apenas o diretor e roteirista François
Ozon para criar uma obra tão profunda em um filme tão breve. Cheio de metáforas
e com cheiro de quero ver novamente. Um epitáfio sobre abandono e desapego, relações humanas e a validade de nossas vidas. Afinal, somos um pouco do personagem principal, ou
gostaríamos de ter sua "coragem". Egoístas a abondonar quem se ama e quem nos ama. Estamos finalmente prontos para abraçar a morte em uma última dança.