A transposição do universo de Harry Potter para os cinemas não era tarefa amadora. E eis que, para os dois primeiros capítulos, foi escalado o experiente e acostumado com temáticas infanto-juvenis Chris Columbus. Responsável por clássicos como os dois Esqueceram de Mim (1990/1992), Columbus, a pedido da Warner e da própria J. K. Rowling, optou por apoiar o conceito estético dos filmes em referências a clássicos da fantasia infantil. Logo, Harry Potter e a Pedra Filosofal (2001) e Harry Potter e a Câmara Secreta (2002) são filmes ingênuos, imberbes e iluminados. Sem tempo para o terror.
A mudança no comando foi possível graças a uma (quase) revolucionária ideia dos estúdios Warner: o convite a Alfonso Cuarón – premiado diretor mexicano – para tomar as rédeas da direção de Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban (2004). A decisão, arriscada a priori, tornou-se acertada após o resultado. O terceiro capítulo da série é, ainda hoje, o mais lúdico, movimentado e desconstruído filme da saga. Cuarón não economizou na necessidade de imprimir sua própria visão do universo de Harry Potter, e alguns fãs mais xiitas, com o perdão do trocadilho, chiaram bastante.
Mesmo à parte a excelência de Cuarón, mais uma mudança foi feita no comando da cinessérie. A bola da vez era Mike Newell, diretor inglês de considerável expressão e tarimbado pelo sucesso de filmes como Donnie Brasco (1997) e Quatro Casamentos e Um Funeral (1994). A escolha para a adaptação de Harry Potter e o Cálice de Fogo (2005), infelizmente, foi responsável por um retrocesso na evolução filmográfica da série. O quarto capítulo da saga é mal editado, confuso e careta. À exceção do primeiro capítulo, ainda incipiente, talvez seja o filme mais aquém das expectativas dos fãs – considerando a história sensacional a qual é submetido.
De M. Night Shyamalan a Spielberg: vários foram os diretores cogitados para dar seguimento à série. A escolha, entretanto, foi por um desconhecido diretor inglês, o quase estreante em longa-metragens David Yates. Escolha que, oportuna, foi responsável por transformar uma sucessão de filmes desconexos em uma referência cinematográfica para os próximos capítulos. Harry Potter e a Ordem da Fênix (2007) e Harry Potter e o Enigma do Príncipe (2009) são filmes corajosos e desprendidos de vícios: um alento para os fãs (os mesmos que, lá atrás, acharam justo criticar Cuarón. O trabalho de descontrução de Yates é quase tão agudo).
Sucesso nas bilheterias, padrão estético e continuidade foram fatores imprescindíveis para a manutenção de Yates na cadeira de diretor para a condução de Harry Potter e as Relíquias da Morte: Parte I (2010) e Harry Potter e as Relíquias da Morte: Parte II (2011). O sucesso, enfim, atingiu maioridade na construção dos dois melhores e mais completos filmes da saga. Dignos de comparação com os maiores clássicos da aventura, os dois últimos capítulos são filmes humanos, extremamente bem dirigidos e, naturalmente, dedicados à memória tardia dos fãs que, com o tempo, viverão apenas da saudade dos filmes de Harry.