Sabe aquelas vezes em que a gente olha pela janela e sente que não precisa fazer mais nada além disso? É. Acontece todo dia: olha, fica, fica, fica. É maravilhoso. Você olha e enxerga, cada passo, cada gesto. O supermercado fica aberto 24 horas e parece que você é um deus. O deus do mercado! Quem sabe. Existem tantos deuses, eu posso ser um.
Outro dia uma moça entrou no mercado e foi um caso especial. Olhou por todos os lados, abriu a bolsa e começou a chorar. Ela era humilde, vestia trapos, mas aparentava bom coração. Quis descer do alto de meu quarto andar de dar-lhe uns trocados, mas não pude, não é permitido o contato. Só observar...
Uma linda mulher loira apareceu, seus cabelos gritavam saúde, sua pele resplandecia de amor, era de uma beleza, ô, até um deus duvida. Ela entrou. Era madrugada. Os seguranças a fitavam tanto que senti uma pontada de ciúmes. Será que tenho algum poder? Eu sou um deus, veja bem. Enfim. A loira ficou duas horas no mercado, entrou a pé, saiu a pé. Conseguiu sair com vida até a porta de entrada, que, ironicamente, também é de saída. Pois é, não tenho poder algum. Meu único poder é não dormir, é o de observar. De que me vale isso? Eu a vi subir, sua alma evaporando pelos céus tijucanos. Tão linda e saudável quanto sua matéria. Chorei. Já vi tanto, enxerguei demais, não quero ser mais ser um deus, pra quê?
Minto para minha própria pessoa, não consigo me desvencilhar disso, é meu trabalho. Observo. Meses depois, casos depois. Sim, mortes, feridos, palhaços, aniversários. Supermercado tem de tudo.
Resolvi sair para tomar um ar e ver de perto as pessoas que observo todos os dias. É, eu falei que não era permitido contato, mas cansei de respeitar tudo que me é ordenado. Fui. Vi. Fiquei atônito com as feições de cada um, como a voz de Rodrigo era esganiçada, seu Joaquim, um dos serventes, era bem mais velho do que aparentava, e dona Ruth, nossa! Dona Ruth tem piercing na língua!
Comprei um pacote de café em pó. Apesar de não precisar, adoro cafeína. A caixa Juliana falou comigo. Espero que isso não seja um problema.
Cheguei em casa, fui pra janela. O supermercado estava lá, tudo igual. Acho que nada mudou. Não recebi advertência alguma. É, quebrar regras não faz mal a ninguém. Até para um deus. De qualquer forma, vou ficar de olhos abertos.
Outro dia uma moça entrou no mercado e foi um caso especial. Olhou por todos os lados, abriu a bolsa e começou a chorar. Ela era humilde, vestia trapos, mas aparentava bom coração. Quis descer do alto de meu quarto andar de dar-lhe uns trocados, mas não pude, não é permitido o contato. Só observar...
Uma linda mulher loira apareceu, seus cabelos gritavam saúde, sua pele resplandecia de amor, era de uma beleza, ô, até um deus duvida. Ela entrou. Era madrugada. Os seguranças a fitavam tanto que senti uma pontada de ciúmes. Será que tenho algum poder? Eu sou um deus, veja bem. Enfim. A loira ficou duas horas no mercado, entrou a pé, saiu a pé. Conseguiu sair com vida até a porta de entrada, que, ironicamente, também é de saída. Pois é, não tenho poder algum. Meu único poder é não dormir, é o de observar. De que me vale isso? Eu a vi subir, sua alma evaporando pelos céus tijucanos. Tão linda e saudável quanto sua matéria. Chorei. Já vi tanto, enxerguei demais, não quero ser mais ser um deus, pra quê?
Minto para minha própria pessoa, não consigo me desvencilhar disso, é meu trabalho. Observo. Meses depois, casos depois. Sim, mortes, feridos, palhaços, aniversários. Supermercado tem de tudo.
Resolvi sair para tomar um ar e ver de perto as pessoas que observo todos os dias. É, eu falei que não era permitido contato, mas cansei de respeitar tudo que me é ordenado. Fui. Vi. Fiquei atônito com as feições de cada um, como a voz de Rodrigo era esganiçada, seu Joaquim, um dos serventes, era bem mais velho do que aparentava, e dona Ruth, nossa! Dona Ruth tem piercing na língua!
Comprei um pacote de café em pó. Apesar de não precisar, adoro cafeína. A caixa Juliana falou comigo. Espero que isso não seja um problema.
Cheguei em casa, fui pra janela. O supermercado estava lá, tudo igual. Acho que nada mudou. Não recebi advertência alguma. É, quebrar regras não faz mal a ninguém. Até para um deus. De qualquer forma, vou ficar de olhos abertos.
