
Crescemos acreditando na imparcialidade de como os fatos são
relatados. Depois de um tempo, percebemos que tudo não passou de um conto,
desses que muitos de nós ouvíamos, quando criança, para dormir. O próprio ato
de relatar já é parcial, uma vez que transmite o pensamento, a interpretação do
fato a partir da ótica do relator. O que se deve fazer é tentar indagar, não
receber uma notícia como algo uma verdade absoluta, até porque ela não existe.
Um belo exemplo de como a emissão de um fato pode ser, digamos exacerbado é o filme Sou Cuba (“Soy Cuba”, 1964, Cuba-URSS) do diretor soviético Mijaíl Kalatozov. Tendo a ilha como seu personagem principal, o longa é formado por esquetes que retratam a história cubana – do período pré-revolução e a tomada de Havana. É claro o apelo soviético e a exaltação dos revolucionários como os grandes heróis. Trata-se de uma visão esquerdista que funciona como propaganda pró-comunismo.
A contradição da Cuba dos cassinos, dos bares, das grandes
festas onde as figuras mais importantes eram os norte-americanos e a “verdadeira
Cuba” dos trabalhadores onde reina a pobreza. O imperialismo deflorando os
sonhos de um povo sofrido, porém honesto e perseverante. Como mesmo diz a voz
da ilha de Fidel: “Cuba dos, cassinos,
divertimentos, também é a dos trabalhadores, das favelas. Não feche os olhos.
Encare”.
Vemos ainda a problemática do campo onde vários agricultores
perderam suas terras para empresas estadunidenses. São famílias inteiras
perdendo seus lares e lavouras. “Quem
responde por esse sangue? Quem responde por essas lágrimas?”, indaga a voz
de Cuba. Ao longo do filme, somos levados a um estado nauseabundo e de cólera. Sentimo-nos
na necessidade de tomar uma arma em punho e rumar ao poder.
Sou Cuba é uma
daquelas obras que fazem parte do acervo mundial. Apesar de não ter sido bem
recebida por cubanos e russos na época de seu lançamento, trata-se de um
tesouro do cinema latino-americano. Intensa, parcial, poética, mas também
perigosa. Aprecie com moderação.