segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

"Magicians do not exist."


ALICE FERMAN

Paris, 1959. É nesse contexto que conhecemos Tatischeff, um mágico alto, magro, idoso e com trejeitos bem afeminados. Fazendo referência à imagem do cineasta Jacques Tati (1907 – 1982), o protagonista de O Mágico ("L’Illusionniste", França/Inglaterra, 2011) é desengonçado e muito cordial. Vestido num terno conservador, ele e seu travesso coelho se apresentam numa casa de show da cidade, porém, logo ao final do espetáculo, são demitidos. Tatischeff decide se mudar para Londres, mas a fria cidade parecia só se aquecer com o rock dos "The Britoons" (uma espécie de The Beatles). O mágico, então, vai tentar a sorte em um bar no interior da Escócia.


Nesse zigue-zague pela Europa o decadente mágico conhece Alice, uma pré-adolescente que trabalhava como empregada doméstica no bar em que ele se hospedara. A menina fica encantada como uma criança pelo ilusionista e, sem demoras, uma ingênua amizade se concretiza. No entanto, dias depois, Tatischeff resolve deixar a cidade e partir para Edimburgo. Alice sem pensar o segue em busca de uma vida melhor e juntos eles passam a viver como "pai e filha" no Little Joe Hotel, um estabelecimento cujos donos eram dois anões. Enquanto o bom senhor fazia “mágica” para alimentar as caras vontades da jovem com as merrecas que ganhava, ela cozinhava e o ajudava com tarefas do lar. No hotel, também moravam: um palhaço magérrimo, um ventríloquísta risonho e três trapezístas bem humorados. Todos velhos. Todos na mesma situação de decadência profissonal a qual a modernidade os submetia.


Cada vez mais opaco, o mundo dos anos 60 perdia seu interesse por qualquer evento que não fosse lógico-racional e, pouco a pouco, o peso dessa realidade caia sobre os ombros dos circenses. Uma cena interessante que retrata bem esse sentimento é quando Tatischeff entra num cinema e se depara com Jacques Tati na telona. Os dois parecem tomar um susto com o choque entre a realidade e a fantasia e saem correndo em direções opostas. Outra conexão que podemos fazer é da coadjuvante, Alice, que vivia no "país das maravilhas" desde a chegada do ilusionista, como a personagem de Lewis Carroll. Além de possuírem o mesmo nome, Alice fica maravilhada quando vê um vestido branco e azul típico como o da “outra Alice” numa vitrine.


Baseada no roteiro original de Tati, a obra foi dedicada à sua filha, Sofie Tatischeff. Mas, segundo o jornal “The Guardian”, O Mágico seria um desabafo do cineasta por ter abandonado a filha mais velha, Helga Marie-Jeanne Schiel, quando adolescente, além de ser o único reconhecimento público de Helga como sua filha. Minuciosamente dirigido por Sylvain Chomet, o filme é uma animação basicamente muda, mas bem conduzida pela trilha sonora. E, mamães e papais, atenção: essa é uma obra mais voltada para o público adulto devido ao conteúdo intenso e ostracista, então pensem bem antes de levarem seu pequeno cult ao cinema.



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