quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

A Selva E Eu

Já não é mais novidade nem surpresa: o cinema australiano está em franca ascensão. Desde os épicos grandiosos e recheados de dramalhão barato (mas com bilheterias polpudas) de Baz Luhrmann, passando pelas animações intimistas da revelação Adam Elliot (de Mary & Max – Uma Amizade Diferente), há no cinema da terra dos cangurus uma capacidade de aliar o rigor de estrutura do cinema britânico ao vigor narrativo do cinema alemão e francês. Reino Animal (“Animal Kingdom”, Austrália, 2010) – drama vencedor do Festival de Sundance de 2010 e que concorre ao Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante – é mais uma prova de que o futuro do cinema australiano realmente promete.


Esqueça o estereótipo: deserto, cangurus, aborígenes e a Ópera de Sidney passam longe da tela no drama cru e urbano de David Michôd. Michôd que, em seu début, resgata a estética do cinema independente americano para contar a história de “J”, um rapaz que, obrigado a viver com a família criminosa, envolve-se diretamente com os esquemas ilícitos de seus tios violentos. Melbourne, revisitada, remete a uma Detroit dos trópicos: o crime não é uma conseqüência do capitalismo nem do crescimento das cidades – é um modo de vida; um arquétipo da brutalidade travestida de resiliência no homem urbano comum.


“J”, no entanto, encontra-se em meio a turbulências diversas que caracterizam, parcialmente, sua necessidade de adaptar-se ao mundo do qual involuntariamente passou a fazer parte. Os sentimentos explosivos dos tios contrastam com a paciência de um detetive que, ao perceber a fragilidade de “J”, envolve-se na causa do garoto com a intenção de protegê-lo de sua própria família. E é a figura de Janine Cody (interpretada magistralmente por Jackie Weaver), avó de “J” e matriarca da família, que contribui com o equilíbrio necessário para garantir a sobrevivência de seus filhos.


Não há mais termômetro pré-Oscar sequer que falhe na hora de fazer as previsões dos principais premiados da grande noite do cinema. As surpresas têm passado bastante longe do Kodak Theatre nos últimos anos, garantindo a monotonia no momento da entrega dos prêmios. Contudo, há de se dizer que, para algumas (poucas) categorias, ainda há um sopro de dúvida que favorece a competição entre os indicados – seu maior exemplo, atualmente, é o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante. Fato que, aliado à necessidade de academia de premiar pelo menos uma das surpresas independentes do ano, credencia Jackie Weaver, mesmo como franco-atiradora, ao Oscar da categoria.


A força de Reino Animal não está, apenas, na capacidade de Michôd de conduzir como referência estética um filme de roteiro simples e preciso. Não importa, aqui, pois, o filme como obra cinematográfica em si. Fica a impressão de que a tríade justiça-família-violência salta aos olhos como um lembrete: há, por mais sutil que pareça, uma ligação profunda entre as três. Há, quase que religiosamente, uma interconexão que as confunde.



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