sábado, 20 de abril de 2013

Uma Laranja de Cílios Postiços


Nunca vou me esquecer da primeira vez que vi Laranja Mecânica ("A Clockwork Orange", Reino Unido/ EUA, 1971). Foi numa aula de inglês da escola sobre ficção científica e um colega trouxe o filme para a turma cheia de adolescentes ignorantes sobre a obra (esse amigo também me apresentou a "Rocky Horror Picture Show", mas essa é outra história). Já na cena de abertura, fui seduzida pela mistura de erotismo bizarro e pura arte cinematográfica presentes no olhar fixo com cílios postiços de Alex DeLarge (Malcolm McDowell) e, para mim, foi amor à primeira vista.


O filme acontece em um mundo paralelo, onde a Rússia ganha a guerra fria. A história narra a saga de Alex e seus droogs, um grupo de jovens excêntricos que se divertem espancando mendigos, invadindo casas aleatórias e estuprando mulheres casadas. Chocante, né? Suas ações permanecem impunes, até o momento em que uma de suas vítimas morre, o que leva Alex à prisão e um tratamento experimental extremo para curá-lo de sua sede pela ultraviolência e mania sexual.


Apesar dos temas intensos, Kubrick e o personagem de Alex tratam a história com tanto sarcasmo que o bizarro é trazido para o normal e o chocante para o engraçado, sem anular a crítica e consequente reflexão. Além disso, através da metalinguagem, o filme quebra paradigmas cinematográficos como com a canção "Singin' in the Rain" do musical "Cantando na Chuva" (EUA, 1952), que é utilizada inesperadamente numa cena de abuso sexual, detalhe trazido pelo próprio ator, quando o diretor mandou ele cantar e dançar e essa era a única música que o veio à cabeça.


E quem sabia que Kubrick quase não dirigiu o filme? O autor do livro, Anthony Burgess, tinha originalmente vendido os direitos cinematográficos por quinhentos dólares para ninguém menos que Mick Jagger, que pretendia que os droogs fossem os Rolling Stones! Mas depois de algumas trocas e vendas, os direitos chegaram às mãos de Kubrick, que revolucionou a obra e, após o lançamento, até recebeu algumas ameaças de morte do público ofendido. Esse tumulto levou a tirar o filme de circulação, que só foi relançado em 2000, após a morte do cineasta.


Através desse texto, você pode pensar que ou este filme é horrível ou que esta humilde crítica é uma pessoa muito, muito estranha, mas garanto que ambas afirmativas seriam errôneas, porque Laranja Mecância é uma obra prima sobre hipocrisia, Beethoven e, Freud explica, símbolos fálicos.

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