quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Brilhando Nas Entrelinhas

“Nosso Lar” é de comer rezando; o trailer não representa nem a ponta do iceberg cósmico quadridimensional que é o longa-metragem. Você sabe que um filme tem dignidade quando se é possível explanar que o protagonista empacotou, sem castrar o gozo de ninguém. Já de início, André Luiz parte dessa para uma melhor devido a uma complicação intestinal e agoniza por longo período no limbo (algo parecido com o Vale dos Suicídas da novela “A Viagem” e Mordor de “O Senhor dos Anéis”). Em meio a pessoas intensas e sujas (tem umas pirigóticas invejosas de rachar o bico), sua alma penada clama por ajuda, ao passo que seres de luz o vem resgatar.



A partir de sua chegada à cidade de Nosso Lar, nos é apresentado o conflito da trama: o “suicídio inconsciente” do personagem, decorrente de anos de negligência consigo mesmo e com os outros. É no pós-vida que terá de encarar a “verdade” latente de seu egoísmo. Este é o mote que guiará esse espectro de sujeito na busca da redenção.


Essa é a versão cinematográfica baseada no livro homônimo, atribuído ao espírito André Luíz e psicografado por Chico Xavier. É o resultado bizarro do cruzamento entre espiritismo e ficção científica. A estética futurista new age acoplada à pedagogia religiosa convergem numa espécie de Comunidade Esotérica do Sétimo Raio neo-hippie e vegetariana, onde noite e dia coexistem e pessoas felizes (mas nunca efusivas) caminham pela cidade em forma de estrela . É a Brasília paradisíaca dos desencarnados, a civilização moderna platônica “do bem”.


A narrativa truncada, por vezes, incita vergonha alheia ao tentar manipular emoções a seco, sem nenhum tipo de vaselina. Por outras, faz rir quando se leva muito a sério. No entanto, seria impreciso julgar o filme como ruim; é como se tivesse sido escrito torto em linhas certas, provocando um caos que atrai mais que mariposa à luz.


Espíritos utilizando notebooks para acompanhar via webcam os encarnados na Terra; Othon Bastos no papel de governador do mundo imaterial se dirigindo à população de almas através de um telão em praça pública; adereços e enfeites de cristal a dar com o pau; transbordamento de azul, rosa e lilás e piadas acerca da fé e do fato de estarem todos mortos, conquistam o coração livre de prejuízos. E esse é o espírito para se ler nas estrelinhas. Não ficando satisfeito, jogue tudo no limbo e entregue a Deus.

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