quinta-feira, 2 de setembro de 2010

O Eterno Suspense [Especial Alfred Hitchcock]


O último filme de Alfred Hitchcock não pode ser classificado. Uma resenha cinematográfica não seria suficiente – fosse o filme uma obra-prima, fosse um completo desastre. A carreira de sucesso de Hitchcock não se resume, enfim, a um estereótipo. Não pode ser determinada por chavões nem por padronizações. Trama Macabra (Family Plot, EUA, 1976) é, portanto, “Hitch” rindo de si mesmo, de seu cinema, de seus fãs. E nada melhor do que um suspense de humor negro para rir da vida, da arte, do tempo. Pois bem.




Um casal de trambiqueiros – uma falsa vidente e um taxista – é contratado por uma senhora aristocrata que procura desesperadamente seu herdeiro perdido. Enquanto isso, um outro casal – de sequestradores – arquiteta crimes perfeitos para obter, como resgate, alguns diamantes raros. A investigação toma rumos inesperados quando a suspeita cai justamente sobre o sequestador que, acuado, bola um plano para eliminar o taxista e sua esposa.


Trama Macabra não é apenas o derradeiro filme de Hitchcock. Talvez, por capricho ou por comodismo, o diretor tenha abusado de seus truques para construir uma obra que abrange quase todas as marcas técnicas que pontuaram os seus sessenta anos como diretor de cinema. Os planos-sequência, as cenas em carros, a importância das escadas, duas louras (uma falsa e uma verdadeira) e uma trilha sonora temática – tudo é uma releitura sutil das características que deram ao cinema de Hitchcock o status de cinema-pipoca com dedo de autor.


A força do filme, portanto, não parece estar, necessariamente, na sua história. A releitura – e isso é evidente – é a forma de expressão máxima da caricatura de um cinema que encontraria seu fim. A opção pela comédia é emblemática dessa escolha. Até a aparição misteriosa de Hitchcock soa mais caricatural, diga-se de passagem. E é perceptível, também, uma informalidade incomum nos diálogos do filme, pese o fato de que, provavelmente, esse é um dos filmes onde Hitchcock aposta em personagens imersos numa realidade de classe média, um pouco distantes dos aristocratas de tweed e das louras frias de tailleur.


A eternização de um diretor só é possível quando seus filmes encontram pouca resistência no tempo, pois, com avanços tecnológicos e escolas cinematográficas que propõem mudanças constantes de linguagem, só uma obra firme e de qualidade irrepreensível é capaz de ofuscar as mudanças de paradigma. Seria Hitch, portanto, capaz de produzir mais obras-primas não fosse seu falecimento alguns anos depois de Trama Macabra? Fica, para nós, bem ao gosto de Hitch, o eterno suspense.
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