Benito Mussolini foi responsável por conduzir a Itália em uma das ditaduras mais autoritárias da história do mundo moderno. Seu legado, antes uma lembrança amarga de um momento tenebroso para a Europa – dada a associação com a Alemanha de Hitler – hoje é, na Itália, contestado por ter trazido, de certa forma, benesses à vida do italiano médio. Tal qual um Getúlio macarrônico. Vincere (Itália 2009), do cineasta Marco Bellocchio, vai contra o recente reposicionamento da figura do “duce” e, com méritos, põe o ditador no seu lugar devido: no lado obscuro dos crueis líderes totalitários do século XX.
A jovem Ida Dalser, ao conhecer o revolucionário e ainda desconhecido Benito, apaixona-se imediatamente pela figura do rapaz que, inflamado pelos ideais do socialismo radical, corre a Milão do início do século com seus discursos – extremamente populares entre a classe trabalhadora. Assim, Ida, perdidamente deslumbrada com a personalidade forte e a crescente influência política do jovem Mussolini, abandona sua vida para dedicar-se única e exclusivamente à escalada de seu amante rumo ao alto escalão da política italiana.
Ida vê-se, posteriormente, grávida de um filho de Mussolini que, após voltar da Primeira Guerra Mundial, casa-se com outra mulher e abandona a mãe de seu primogênito. Ida, desesperada, proclama país afora sua relação com Benito que, consequentemente, torna-se extremamente poderoso, alçando-se ao posto de ditador e líder da Itália fascista. Mussolini, naturalmente, nega qualquer envolvimento com a moça, causando, portanto, uma mobilização do governo para que Ida seja escondida da população italiana.
Vincere é uma importante e necessária análise sociológica da história do século XX já que, ao percorrer a trajetória de Benito Mussolini ao comando da nação, reconstitui a figura do ditador através de sua necessidade quase fisiológica de poder; sua ganância e, naturalmente, sua indiferença ao fator humano. O filme é um tratado sobre o tempo; uma belíssima reconstituição dos motivos que tornaram ditaduras possíveis num período improvável da história.
E, como não poderia deixar de ser, vemos em Vincere um tratamento quase perfeito dos seus aspectos técnicos: desde a fotografia quase perfeita – uma aposta em sombras e subexposição, até o trabalho dos atores que, com menção especial para Filippo Timi – intérprete de Mussolini, prendem a respiração da plateia com um vigor que beira o sublime. A interpretação, diga-se de passagem, funciona quase como um paradoxo: há, na política, separação entre o homem e a persona pública? Fica a dúvida. Reflitamos.
