sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Certas Ausências Onipresentes



Lúcia é a personagem para qual não precisaram escalar uma atriz. Sem aparecer uma única vez ou sequer ter o nome citado durante todo o filme, ela desencadeia, ainda que indiretamente, todos os acontecimentos. Aliando um roteiro poderoso e a atuação excelente de Tessa Ia, o diretor Michel Franco mostra com clareza e poesia que, na vida dessa família, existe mesmo um antes e um Depois de Lúcia ("Después de Lucía", México, 2012). 



Numa tentativa de recomeçar, fugindo da tristeza pós-morte da mãe e esposa Lúcia, pai e filha se mudam para a Cidade do México. Nova casa, novo emprego, nova escola, mas a vida só piora. A ausência é forte e onipresente, e o distanciamento crescente dos dois cria ruídos na comunicação. Quando começa a sofrer abusos físicos e emocionais dos novos colegas, a menina resolve encarar tudo calada, pacífica, com resignação. Ela esconde do pai as humilhações, mas o que era uma tentativa de poupá-lo de mais sofrimento acaba tendo um desfecho inusitado.



Tudo se combina para fazer do filme uma experiência angustiante. O roteiro tornou a trilha sonora dispensável, e assim temos uma história contada por silêncios. A atuação merece grande parte do destaque. Tessa Ia, enquanto protagonista, se destaca, mas os outros atores também impressionam pela naturalidade. O entrosamento dos jovens é tanto, que mesmo as cenas mais intensas de abuso são extremamente realistas. Palmas à preparação de elenco. 



Em sua obra-prima, Michel Franco prova que as pessoas podem se tornar bestiais se lhes é dada a permissão para isso. Nesse retrato pessimista e incômodo do ser humano, o diretor explora os limites do comportamento adolescente, chamando a atenção para um assunto sério cujas consequências a maioria ignora: o bullying. Depois de Lúcia é tão bom que sufoca... Ou tão bom por sufocar.

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